Teikei, A Comunidade Sustenta a Agricultura – CSA
O conceito foi inicialmente concebido no Japão no início dos anos 1970,
para tentar assegurar uma alimentação sadia numa época em que a poluição pelo
mercúrio provocou a doença Minemata, o leite materno envenenando as crianças e
a poluição provocando graves estragos de uma maneira geral. Sob, principalmente,
a iniciativa de Yoshinori Kaneko, veio à luz o sistema Teikei japonês. Um
fenômeno similar nasceu no mesmo momento na Suíça, sem relação aparente.
Alguns associam a origem do CSA no Ocidente, a ideias propostas por Rudolf
Steiner, fundador da Antroposofia, da pedagogia Waldorf e da agricultura
biodinâmica dentre outras variadas atividades, ainda na década dos anos 20. Independente
de sua origem, a propagação e desenvolvimento desse modelo é algo orgânico e
nasce como uma resposta natural, ou uma busca por uma condição de alimentos
mais saudáveis e relações mais justa e humanas no comércio que beneficiam produtores,
consumidores e modelos de agricultura menos agressivos para o Solo e meio
ambiente, e ainda beneficia e incentiva o desenvolvimento individualidade do
local.
Teikei e CSA são versões, do Oriente ao Ocidente, de um modelo de
agricultura apoiado diretamente pela comunidade onde o agricultor deixa de vender
seus produtos através de intermediários, e conta, para organização e
financiamento de sua produção, com a participação de membros consumidores,
colaborando para o desenvolvimento sustentável da região, estimulando um comércio
mais justo. Todos os custos de marketing convencionalmente bancados pelo
agricultor são eliminados. Assim, os consumidores e os produtores, podem juntos
criar uma Agri-Cultura-Alimentar, compartilhando tanto as suas responsabilidades
pela produção dos alimentos, quanto pela conservação do Solo e paisagem. [1]
“CSA, significa também, que os membros podem vivenciar o quanto suas
decisões e escolhas tem influência sobre a terra. Para os participantes, e
especialmente para as crianças, há a possibilidade de conhecer de perto o dia a
dia dos sítios e participar ativamente nos dias de campo, plantando, colhendo e
cuidando dos animais. Os alimentos são distribuídos entre os membros da comunidade,
entregues em depósitos próximos de suas residências, semanalmente.” [1]
Atualmente, cerca de 20 milhões de pessoas adotaram o Teikei no Japão, na
França é conhecido como Amap, existem CSAs em todos os países do leste Europeu,
nos Estados Unidos cerca de 15 mil pessoas já adotaram o sistema, no Brasil parece
ter início em 2012 em Brasília e hoje conta com mais de 40 CSAs.
Entre as diretrizes que norteiam a formação de uma CSA, está a
solidariedade, a diversificação da produção, a aceitação dos produtos de época,
as finanças compartilhadas, relações de amizade, gestão democrática,
aprendizagem mútua e estabilidade para o agricultor.
Para o Teikei japonês, são conhecidas as 10 diretrizes:
1. Princípio do apoio mútuo. A essência da parceria aqui em questão não
fica somente no comércio, mas em relações amistosas entre as pessoas. Por isso,
ambos, produtores e consumidores, devem ajudar um ao outro com base no
entendimento mútuo. Essa relação deve ser estabelecida por meio de reflexão
sobre experiências passadas.
2. Princípio da intencionalidade da
produção. Os produtores
devem, por meio de consulta aos consumidores, procurar produzir a máxima
quantidade e diversidade de produtos dentro da capacidade de suas fazendas.
3. Princípio de aceitar os produtos. Os consumidores devem aceitar todos os
produtos produzidos de acordo com consulta prévia entre os dois grupos. A dieta
dos consumidores deveria ser baseada o máximo possível nesses produtos.
4. Princípio da concessão na decisão do
preço. Ao decidir o valor a
ser pago pelos consumidores, os produtores devem considerar que há redução de
trabalho e custo para classificação e embalagem, e que os produtos são todos
aceitos. Já os consumidores devem considerar o benefício de receber alimentos
frescos, saudáveis e saborosos.
5. Princípio do aprofundamento de relações
amistosas. O
desenvolvimento contínuo desta parceria requer o aprofundamento de relações
amistosas entre os produtores e os consumidores. Isso só pode ser alcançado
maximizando os contatos entre os parceiros.
6. Princípio da auto distribuição. O transporte dos produtos até os locais de
distribuição deve ser realizado ou pelos produtores ou pelos consumidores sem
depender de transportadores profissionais.
7. Princípio da gestão democrática. Os dois grupos devem evitar depender muito
de alguns poucos líderes nas suas atividades. Além disso, devem tentar praticar
uma gestão democrática, com responsabilidades compartilhadas entre todos. As condições
particulares das famílias dos membros devem ser levadas em consideração com
base no princípio do apoio mútuo.
8. Princípio da aprendizagem coletiva. Ambos os grupos, produtores e
consumidores, devem dar muita importância a aprender coletivamente, de maneira
que suas atividades sejam mais do que só a distribuição de produtos saudáveis.
9. Princípio de manter um tamanho apropriado
do grupo. Realizar os
princípios mencionados acima será difícil se o número de parceiros ou o
território dos grupos forem muito grandes. Por isso, estes dois devem ser
mantidos com um tamanho apropriado. A inclusão de mais pessoas deve se dar
preferencialmente pelo aumento do número de grupos e da colaboração entre eles.
10. Princípio do desenvolvimento contínuo. Na maioria dos casos, nem os produtores
nem os consumidores poderão desfrutar de condições tão boas como acima
mencionadas, desde o início. Por isso é necessário, para ambos os grupos,
escolher parceiros promissores, mesmo que sua situação presente seja
insatisfatória, e avançar neste esforço em cooperação mútua.
As 10 diretrizes do Teikei trabalham diretamente o desenvolvimento de virtudes
humanas do indivíduo (Agricultura
Livre), agricultor e consumidor ou co-agricultor, voltadas a relação com os
outros. Na visão do pesquisador americano Stephen Covey [2] sobre
desenvolvimento humano, essas virtudes estão relacionadas a interdependência ou
a conquista da vitória pública, e são associadas ao exercício de ações até se consolidarem
e se tornarem hábitos de buscar acordos de benefício mútuo, trabalhar a empatia
ou a capacidade de ouvir genuinamente o outro, e por último criar sinergia.
Importante observar toda e qualquer estrutura ou associação, depende inicialmente
do desenvolvimento individual de seus elementos humanos, e que mesmo a mais bem
feita e elevada estrutura de diretrizes não alcançará sucesso, se os indivíduos
que a compõe, individualmente, não forem capazes de reconhecer a necessidade de
desenvolvê-las. Covey reconhecendo essa realidade
em suas pesquisas e experiências, coloca em Ordem na sua obra, que a vitória
individual ou o exercício de ações que auxiliem a expressão das virtudes
humanas do indivíduo precede a chamada vitória pública, ambas fundamentais no nosso
desenvolvimento, mas na devida ordem.
De qualquer forma, ter um ambiente de convívio com outras pessoas onde
podemos exercitar nossas virtudes com relação aos outros, tendo como orientação
diretrizes muito bem-feitas, é algo muito importante e positivo e infinitamente
melhor do que não as telas. O Teikei parece realmente trazer essa possibilidade
para aqueles que reconhecem essas qualidades humanas, e idealmente sem peso, no
sentido de objetivos ou metas, mas como ideais de orientação, o que torna suave,
alegre e descontraído o ambiente de desenvolvimento humano.
É possível notar a convergência das áreas de conhecimento humano,
estamos falando de agricultura, relacionamentos, desenvolvimento humano, modelo
de economia, modelos sociais e em todos eles, a importância do indivíduo e seu autoconhecimento
com relação a sua natureza, objetivos para questões externas e ideais para o
desenvolvimento interno.
Outro ponto importante, é o apoio a conversão dos agricultores de
sistemas convencionais, que degradam o Solo, à sistemas menos agressivos, essas
comunidades também apoiam o agricultor na fase de conversão, garantindo a compra
de sua colheita, onde o agricultor é incentivado e pode ter estabilidade e
tranquilidade nessa fase mais delicada, e a comunidade ganha mais um produtor
para abrir o leque de variedades de produtos e quantidade.
Como
funciona
Os consumidores pagam uma mensalidade e recebem os produtos semanalmente
de acordo com o que estiver sendo colhido, respeitando a sazonalidade e aspectos
do produto, não há exigências quanto a padrão de aspecto externo do alimento,
oque evita desperdícios e educa o consumidor a valorizar o alimento pelo frescor
e maior valor nutritivo resultado de uma agricultura menos industrializada.
Alguns CSAs, entregam as cestas com os produtos da colheita do momento sem
opção de escolha, outros disponibilizam em uma plataforma na internet os
produtos daquela semana e seus coagricultores selecionam oque desejam
utilizando créditos que recebem pelo pagamento da mensalidade, gostei mais
desse modelo pela sua flexibilidade de opção ao consumidor.
As entregas são retiradas no local do plantio ou em pontos de entrega
que pode ser até a residência de alguém membro da comunidade, onde os outros
pode ir buscar com mais facilidade, esses detalhes são ajustados entre todos.
O dias de campo são os eventos para a participação dos coagricultores
diretamente nos processos, plantio, capina e cuidados, colheita, separação dos
itens e outras atividades.
Possuem também um gerenciamento compartilhado e transparente de contas,
despesas e custos em conjunto com o planejamento de plantio com os
agricultores.
Quanto ao apoio a projetos de conversão de sistemas produtivos não
consegui maiores informações, talvez por simplesmente se enquadrarem no sistema
dos agricultores já participantes. Aulas e treinamentos sobre como funciona o
CSA são realizados em algumas localidades e provavelmente também voltados ao
novo método de produção proposto pelo CSA.
Agricultura
Livre e o Teikei-CSA
Umas das características que mais chama a atenção é a descentralização
promovida por esse modelo, e os benefícios que essa característica possibilita:
- Dignidade, respeito e proteção aos pequenos agricultores.
- Melhor qualidade de produtos e localidade.
- Desenvolvimento local através de melhores rendas para os agricultores
e preços justos para consumidor que além do produto recebe experiencias e
conexão com o processo natural do alimento e contato com o Solo.
- Atração e retenção de novos agricultores, pois já não são
marginalizados e passam a ser os atores da maior importância.
- Pouca ou nenhuma dependência de grandes burocratas, empresas,
certificações ... já que a relação de confiança é estreitada pela presença e
condução compartilhada das ações.
O primeiro passo será o desenvolvimento de um teste MVP (Minimum
Viable Product – Produto Mínimo Viável) voltado a uma ferramenta de economia
colaborativa para projetos de implantação em
novas áreas.
O Projeto Piloto para o teste MVP, será realizado em uma área de 2 hectares utilizada e degradada
pela agricultura convencional através de máquinas pesadas e adubação química e
orgânica por mais de 30 anos. Será um belo desafio.
Será estruturado de forma a exercita a aplicação do princípio da Agricultura Natural e também conhecimentos técnicos da ciênvia de solo, processo produtivo da Agricultura Sintrópica e
obviamente do conhecimento dos agricultores locais, experientes em Agricultura
Natural. O principal em um MVP é validar uma proposta e capturar o máximo de
informações possíveis, nesse caso dos agricultores e proprietário da área, e dos
coagricultores que poderão participar da implementação colaborando com a
aquisição de lotes da produção e ou participação nas atividades que serão
desenvolvidas. Na área de projetos do blog devo no futuro detalhar melhor a
proposta.
Felipe Lupusella
Referências
[1] – http://csabrasil.org/
[2] - Os 7 Hábito das pessoas
altamente eficazes – Stephen Covey
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